O que é o saber? Como podemos alcançá-lo? Onde podemos alcançá-lo?
Podemos considerar que saberes são valores adquiridos e, a cada dia, constata-se que esse conjunto de valores é construído, alcançado de várias formas e nos mais diversos lugares. A todo momento, não somente em espaços escolares, há a construção do saber. Podemos classificar esses locais como espaços informais, não-formais ou formais de ensino.
Segundo Arosa; Schilke(2007), nos espaços informais, a construção do conhecimento se dá de forma despojada, formando-se o saber do senso comum, não há uma intencionalidade pedagógica, uma sistematização. Um bom exemplo é o aprendizado obtido dentro da família, na comunidade na qual a criança está inserida em que são transmitidos valores morais, éticos, comportamentais, sem que haja também um planejamento prévio.
Nos espaços não-formais, o processo educativo acontece já com alguma intencionalidade sistematização, porém, não acontece em instituições regulamentadas, como as organizações religiosas. Nestes espaços o pedagogo também pode atuar, assim como outros profissionais, através de iniciativas como, por exemplo, as brinquedotecas e a ONG intitulada “Doutores da Alegria”, que levam a ludicidade aos pequenos pacientes, acompanhada de uma aprendizagem que podemos chamar de ocasional, já que toda experiência traz como resultado um aprendizado.
Já nos espaços formais, a construção do ensino ocorre com prévio planejamento, repleto de intencionalidade através de profissionais qualificados, em instituições devidamente regulamentadas, formando o senso crítico, obtendo-se como resultado, uma aprendizagem significativa.
Mas, apesar de ter essa estrutura, os espaços formais de ensino não precisam ser necessariamente em escolas, pois nem sempre as crianças tem condições de frequentá-las, já que, muitas das vezes, a construção de conhecimentos fica comprometida, devido à situações que levam a criança a sentir-se à margem da sociedade, como uma internação, por exemplo.
Nos hospitais, os pacientes, são vistos como números no prontuário, são conhecidos pelo problema que os levaram a se internar e não pela sua subjetividade. São privados do convívio social, escolar, familiar, tendo suas vidas interrompidas durante o período de internação e muitas das vezes não conseguem reintegrar-se a rotina vivida antes da hospitalização, contribuindo para o aumento nos índices de evasão escolar.
É nesse contexto que se faz necessária a existência de uma educação intencional em ambiente hospitalar, através das classes hospitalares, lugares onde há a ênfase na aprendizagem escolar liderada pelo pedagogo, auxiliando a promoção da humanização no ambiente hospitalar, garantindo e colocando em prática os direitos da criança à educação e à saúde, representando uma efetiva colaboração à concretização do tratamento e da escolaridade da criança enferma, formando uma ponte integradora entre a criança, sua família e toda a equipe hospitalar, trazendo efeitos benéficos que vão desde a inclusão desse aluno na escola após a alta médica, até a melhora ou cura de sua enfermidade, pois de acordo com pesquisas conduzidas pela professora Izabel Cristina Silva Moura, do Instituto Helena Antipoff, vinculado à Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, “o grupo que assistia às aulas teve níveis de estresse menores do que os que não passavam por esse tipo de atendimento, de acordo com uma escala especial para esse tipo de análise”(BIBIANO, 2009, p.83).
A legislação brasileira reconhece o direito das crianças e jovens hospitalizados ao atendimento pedagógico-educacional. A Declaração dos Direitos da Criança e do Adolescente Hospitalizados, Resolução n° 41, de Outubro de 1995 (DOU 17/19/95), decorreu da formulação da Sociedade Brasileira de Pediatria e da Resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente com a chancela do Ministério da Justiça em 1995 e diz em seu artigo 9º:
Direito de desfrutar de alguma forma de recreação, programas de educação para a saúde, acompanhamento do curriculum escolar durante sua permanência hospitalar(BRASIL, 1995).
Essa modalidade de atendimento denomina-se classe hospitalar, prevista pelo Ministério da Educação e do Desporto em 1994, através da publicação da Política Nacional de Educação Especial (MEC/SEESP, 1994).
Visando essa nova forma de aprendizagem, o Governo Federal instituiu o documento “Classe Hospitalar e Atendimento Pedagógico Domiciliar: Estratégias e orientações”, que entre outros princípios, estabelece que:
Cumpre às classes hospitalares e ao atendimento domiciliar elaborar estratégias e orientações para possibilitar o acompanhamento pedagógico-educacional do processo de desenvolvimento e construção do conhecimento de crianças, jovens e adultos matriculados ou não nos sistemas de ensino regular, no âmbito da Educação Básica e que encontram-se impossibilitados de frequentar escola, temporária ou permanentemente e, garantir a manutenção do vínculo com as escolas por meio de um currículo flexibilizado e/ou adaptado, favorecendo seu ingresso, retorno ou adequada integração ao seu grupo escolar correspondente, como parte do direito de atenção integral(BRASIL, 2002, p.9).
No que diz respeito ao direito à educação, o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069/1990, afirma em seu artigo 53, que a criança tem direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa e preparo para o exercício da cidadania.
No que diz respeito ao direito à saúde, o E.C.A. afirma em seu artigo 7º que a criança tem direito à proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso em condições dignas de existência. E ainda, no artigo 3º:
A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios,todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade(BRASIL, 1990, p. 22).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9394/96, promulgada em 1997, garante em seu artigo 5º o acesso de qualquer cidadão ao ensino fundamental, sem restrições, assim como em seu artigo 23º, em que assegura a organização da Educação Básica para atender qualquer peculiaridade, sempre que o interesse for o processo de aprendizagem.
A Pedagogia Hospitalar é o desafio que se impõe ao pedagogo como um novo horizonte educacional. Incita-nos a buscar alternativas para sensibilizar os educadores e desenvolver projetos de pesquisas e modos de atuação cada vez mais condizentes com essa nova realidade.